segunda-feira, 5 de junho de 2017

Dica da semana Cinestória #11 - Feios, sujos e malvados

Decadência, caos social, calamidade humana, dilaceração da esperança: uma realidade trágica, crua e corrosiva retratada pelo filme italiano Feios, sujos e malvados (Brutti, Sporchi e Cattivi, no original). Dirigido por Ettore Scola e lançado em 1976, Feios, sujos e malvados, é considerado um dos grandes clássicos do cinema italiano, recebendo o prêmio de melhor direção no 29º Festival de Cannes.


O universo retratado pelo filme é praticamente um apocalipse social. A história se passa em uma favela nas redondezas de Roma, onde vive Giacinto, interpretado por Nino Manfredi, e sua curiosa e caótica família. Giacinto, seus dez filhos, netos e outros tantos parentes e pessoas próximas, vivem e sobrevivem juntos em um minúsculo e decadente barraco de apenas três cômodos, onde regras, convenções e valores morais recebem definições bastante incompatíveis com os padrões estabelecidos pela racionalidade. Feios, sujos e malvados é uma tragicomédia que, ao mesmo tempo, nos faz rir das inusitadas situações e nos choca devido àquilo que é retratado. O foco central da trama gira em torno de uma indenização recebida por Giacinto, ocasionada por um acidente de trabalho, onde ele perdeu um olho. Sabendo do dinheiro recebido por Giacinto, toda a família usa das mais variadas artimanhas para tentar se apossar da pequena “fortuna” do patriarca, a qual ele mantém sempre muito bem escondida. Esse dinheiro move o conflito familiar, no qual a avareza de Giacinto e a ganância e a maldade da família levam ao desfecho caótico da trama.

Feios, sujos e malvados nos faz pensar em várias coisas, mas possivelmente um aspecto básico é a ênfase em um ciclo de miséria, pobreza e decadência humana que sempre se repete. Giacinto, a Nona, a amante prostituta, os familiares preguiçosos, etc., são estereotipados, mas elementos que efetivamente fazem parte dos nossos contextos, mesmo que na maioria das vezes, na periferia de nosso mundo, longe dos holofotes. Embora seja uma obra de ficção, a proposta do filme é justamente chocar e mostrar que esse mundo existe, que seres humanos podem ser maus, viver em condições desajustadas e que isso é algo que naturalmente se repete, pois parece não haver qualquer interesse em fazer com que essas situações sejam modificadas. Esse ciclo fica bastante explícito ao se acompanhar desenrolar da história da menina que aparece nas cenas iniciais e na cena final da obra.

Nesse contexto, pode-se fazer uma pergunta simples: há moralidade no caos? Os valores que regem o mundo em Feios, sujos e malvados são os apostos daqueles que gostaríamos de ter em nosso mundo. Mas como poderia ser diferente? Como desejar que pessoas ajam como seres humanos racionais se vivem em condições não humanas? Feios, sujos e malvados é um filme muito bacana e tão complexo que talvez seja preciso vê-lo várias vezes para poder absorver adequadamente a crítica construída por Scola. Em todo caso, uma dica certeira.

Kariel Antonio Giarolo
Professor de Filosofia - IFC Luzerna

FICHA TÉCNICA
Título original: Brutti, Sporchi e Cattivi
Gênero:  Comédia dramática
Direção: Ettore Scola
Elenco: Nino Manfredi, Maria Bosco, Franco Merli
Duração: 115 minutos
Ano de produção: 1976
País de origem: Itália

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